Para tributaristas, retomada do voto qualificado no Carf deve aumentar judicialização de processos

Para tributaristas, retomada do voto qualificado no Carf deve aumentar judicialização de processos

Foi uma vitória do governo reinstituir o voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), mas isso não significa que a arrecadação tributária vai aumentar de imediato

Foi uma vitória do governo reinstituir o voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), mas isso não significa que a arrecadação tributária vai aumentar de imediato. A única certeza é o aumento da insegurança jurídica, observa o tributarista Edemir Marques de Oliveira, fundador do Marques de Oliveira Advogados.

“Não há um aumento de arrecadação imediato. Tem um passo antes, que é fazer a cobrança e eu, contribuinte, se achar que tenho razão e argumentos no que estou contestando administrativamente, vou manter ela (o processo) no Judiciário”, argumenta.

A volta do voto de qualidade no Carf foi oficializada por meio da MP 1.160/23 publicada em 12/01, o que é uma notícia ruim para os contribuintes. O Carf é um colegiado formado por representantes da União e contribuintes (empresas) para julgar litígios de matéria tributária e aduaneira em segunda instância administrativa.

De acordo com o Ministério da Fazenda, a volta do voto de qualidade e outros mecanismos jurídicos no Carf deve aumentar em R$ 50 bilhões a arrecadação tributária neste ano, mais uma receita anual permanente de R$ 15 bilhões. A medida faz parte do pacote de medidas federais para diminuir o rombo das contas públicas.

Judicialização

A questão fica ainda mais complexa pelo fato de a MP ter validade de 120 dias para ser convertida em lei pelo Congresso, e há parlamentares que já se manifestaram contra a medida. Se a MP for rejeitada pelo Congresso, os efeitos jurídicos serão anulados.

Nesse cenário, a judicialização é um caminho muito provável que as empresas vão considerar, de acordo com Douglas Barros Farah, especialista em Tributos e diretor de operações do Grupo AG Capital, consultoria especializada em compliance tributário.

“Essa mudança imediatamente trouxe desdobramentos que aumentam a insegurança jurídica do país, como por exemplo, aumento de liminares que concedem ao contribuinte o direito de não ter seu caso julgado no Carf durante a vigência da Medida Provisória que reinstituiu o voto de qualidade”, avalia Farah.

Segurança jurídica

Para Oliveira, a forma mais eficiente de aumentar a segurança jurídica é simplificar o sistema tributário. “Está se falando muito que o voto de qualidade é problema, não é problema, aumenta a arrecadação, não aumenta. Na verdade, a legislação tributária é muito complexa e quem tem que interpretar é o contribuinte. O voto de qualidade é só uma ponta no iceberg e o governo deveria fazer uma reforma tributária, simplificar a legislação e as obrigações”, afirma Oliveira.

O especialista cita, como exemplo, a dificuldade de um contribuinte em interpretar a lei tributária e uma legislação mais simples evitaria litígios e discussões administrativas, reforça Oliveira.

“Ele coloca um produto no mercado interpretando a legislação de uma maneira e, de repente, vem a Receita falando que está errado e vai autuar o procedimento. Daí o contribuinte acha que tem razão naquela interpretação e isso vai para uma discussão administrativa [no caso, o Carf]. Tudo isso porque a legislação é complexa. E, muitas vezes, é o próprio contribuinte quem tem essa necessidade de ir ao Carf (para resolver questões como essa)”, opina.

Voto de qualidade

Com o voto de qualidade restabelecido no Carf, a prerrogativa de desempate volta o presidente de tribunal. Visto que ele sempre é um representante da Fazenda Nacional, o voto qualificado tende a ser usado pelo presidente para desempatar causas a favor da União.

Desde 2020, caso houvesse empate em um litígio tributário, a sentença automaticamente era considerada em favor do contribuinte. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirma que nesse período, o estoque de processos acumulados no Carf quase dobrou de R$ 600 bilhões, em 2019, para mais de R$ 1 trilhão em outubro de 2022.

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